Pavimentação das vias urbanas: algumas reflexões

Até as décadas de 1970 e 1980 a maior parte das vias ou ruas das cidades brasileiras, inclusive as regionais, eram pavimentadas com paralelepípedos – os denominados calçamentos.

Regionalmente, as peças dos paralelepípedos, confeccionadas a partir de rochas de basalto (pedra ferro), eram colocadas lado a lado sobre uma base no solo da via a ser calçada, preparada para tal, tendo os espaços entre estas preenchidos por pedriscos ou areia. 

A partir da década de 1990, principalmente, as ruas urbanas passaram a ser pavimentadas com asfalto, e aquelas construídas de paralelepípedos foram cobertas por uma camada asfáltica. Dentre as justificativas, destacavam-se, além de representar valores financeiros mais acessíveis, a disponibilidade e acesso ao produto (asfalto), sinônimo de bem-estar, segurança, conforto, facilidade para o trânsito, redução de poeira e de ruídos, “qualidade de vida” e “desenvolvimento” para as cidades. Deste modo, as administrações públicas, especialmente, e com o apoio da população citadina, aderiram majoritariamente a esta modalidade. 

Como consequências, o asfaltamento das ruas urbanas tem gerado maior compactação e impermeabilização dos solos, aumento das temperaturas e impactos nos eventos de inundações urbanas. Por outro lado, entre as vantagens das ruas pavimentadas com paralelepípedos ou pavers, destacam-se: a geração de empregos locais ou regionais, desde o processo de corte e preparação das peças, passando pela execução e manutenção das vias, além da resistência, durabilidade e sustentabilidade social e ambiental que proporcionam. 

Isso se deve, sobretudo, ao fato de que as fissuras entre as peças de paralelepípedos ou pavers permitem a infiltração da água da chuva no solo, evitando o escoamento superficial e a elevada velocidade das águas pluviais, contribuindo para a redução de inundações e alagamentos urbanos, entre outros benefícios. 

Ainda: de acordo com os projetos de construção e operação, a disponibilidade ou a colocação dos paralelepípedos no solo, seja nas ruas ou praças, pode diferenciar em cores, texturas, formas geométricas e dimensões. Então, neste sentido, é possível pavimentar ruas, estacionamentos e outros espaços urbanos com diferentes composições, disposições e ornamentações, as quais podem produzir diferentes visuais estéticos e de beleza cênica. 

Também, em alguns casos, a utilização de paralelepípedos ou pavers com coloração mais clara propicia melhor luminosidade e visualização noturna. Já nos períodos do dia, este fato pode contribuir para a redução da temperatura e no microclima do ambiente, proporcionando maior conforto térmico e ambiental. 

Ao mesmo tempo em que as ruas pavimentadas com paralelepípedos impactam positivamente no ambiente, também impulsionam a economia, pois geram trabalho, tanto na fabricação quanto na sua instalação. Além disso, contribuem para o resgate e a valorização do patrimônio cultural. 

No município de Concórdia, por exemplo, havia até mesmo a Cooperativa de Cortadores de Pedra (Coopedra). 

A profissão de calceteiro perpetua-se no tempo. Normalmente, este ofício é tradicionalmente transmitido de pai para filho ou de geração para geração: eles aprendem sobre a profissão desde a maneira de compactar e preparar o solo, além de observar e fazer o assentamento cuidadoso na disponibilidade das pedras para formar mosaicos com os paralelepípedos, entre outras práticas. 

Considera-se que as vias urbanas de maior fluxo de veículos, assim como as de intensa aclividade ou declividade, além das rodovias, devem ser asfaltadas, visto que a movimentação intensa exige maior velocidade e segurança e facilitam a mobilidade. 

No entanto, as ruas ou travessas de menor tráfego de carros, os pátios de estacionamentos e os acessos a condomínios, estabelecimentos comerciais, residenciais e outros podem ser construídas e mantidas com paralelepípedos ou pavers. 

Será que todas as ruas das cidades precisam ser pavimentadas com massa asfáltica de forma padronizada e homogênea? E se apenas as pistas de maior circulação recebessem asfalto, enquanto as áreas de estacionamento lateral fossem revestidas com paralelepípedos ou pavers? 

Neste contexto, as cidades, cada vez mais, precisam ser confortáveis e seguras ambientalmente e, inclusive, atuarem como espaços de retenção de água – as denominadas “cidades esponjas”, ou seja, apresentar espaços de infiltração de água no solo, contribuindo para a redução das eventuais inundações, do desconforto e de riscos humanos. 

Lembremos: os solos são os maiores armazenadores de água! Por isso, a importância da promoção do debate, de ouvir especialistas com conhecimento em urbanismo, de sensibilidade ambiental e de saber acerca da viabilidade da aplicação técnica, bem como, a necessidade do planejamento e gestão urbana associados ao bom senso, considerando as condições e contextos em que vive a maior parte das pessoas. 

Por esses e outros motivos, considero fundamental incentivar a sociedade a observar, refletir e participar das decisões, além de colocar em prática ações viáveis para melhorar o ambiente em que se vive, especialmente no contexto urbano. 

Dr. Jairo Marchesan – Docente da Universidade do Contestado (UNC). E-mail: jairo@unc.br

 



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